domingo, 6 de fevereiro de 2011

A música erudita brasileira

Segue abaixo o texto de um editorial (sem título) publicado no periódico bimensal brasiliense Música Em Brasília, edição de jul/ago de 2005, pela Livraria MusiMed de Brasília, especializada em publicações musicais.

Embora datado, o artigo contém elementos que ainda podem servir como subsídio para discussão sobre uma das obscuras facetas da produção cultural brasileira e a realidade por ela vivida: a  música erudita nacional, "prima pobre e praticamente desconhecida da música popular" como observa o próprio autor, Bohumil Med, músico clássico (trompista) de origem tcheca, radicado no Brasil desde 1968. Ainda no Rio de Janeiro, Bohumil Med atuou na Orquestra Sinfônica Brasileira, tendo também ministrado aulas no Instituto Villa-Lobos. A partir de 1974, tornou-se professor da Universidade de Brasília, inicialmente como trompista, ocupando depois a cadeira de Teoria da Música e Percepção Musical. Várias vezes condecorado pelos governos brasileiro e tcheco, publicou quatro livros, sendo Vida de Músico não é Fácil seu lançamento mais recente, de 2004. Atualmente, é aposentado pela UnB.

Vale lembrar que a produção musical erudita brasileira não se restringe apenas a Carlos Gomes e Villa-Lobos - para citar-se os mais conhecidos no gênero - dando os primeiros passos ainda nos primórdios do Brasil-colônia. Ocorre porém que, se a música erudita ganhou um pouco mais de divulgação e até de reconhecimento no exterior, foi justamente através destes compositores, como demonstra este artigo em um breve panorama histórico da música erudita no Brasil.

Segue o texto do editorial. Eventuais links foram adicionados ao corpo do texto, a título de simples informação.

Iracema Brochado

O governo brasileiro está promovendo com pompas e recursos o "Ano do Brasil na França". Analisando a programação oficial constatamos, com muita tristeza, que a música erudita brasileira foi totalmente alijada. Para os organizadores, o país não tem o que mostrar no exterior. Na concepção deles, não existem valores representativos. Nem compositores, nem intérpretes. O público francês vai pensar que a cultura musical brasileira se restringe, com raras exceções, às mulatas das escolas de samba, à música folclórica e popular.

A imagem que o próprio Brasil projeta no exterior já não é das melhores. Filmes como Cidade de Deus, Carandiru e outros, embora de qualidade, só mostram o lado negativo. As manchetes internacionais, quando se referem ao Brasil, só falam sobre o desmatamento da Amazônia, as favelas, a violência, o tráfico de drogas, a corrupção no governo, o turismo sexual e, caso raro do que é bonito, o futebol brasileiro. E quando há uma oportunidade de mostrar um dos lados cultos e positivos, no qual, sem a menor dúvida, a música erudita brasileira se enquadra, os organizadores a desprezam! Não dá para entender!!

O pior é que essa postura não é exclusividade desse projeto. No Brasil, a música erudita é a prima pobre e praticamente desconhecida da música popular, e seria totalmente ignorada pelos nossos meios de comunicação, não fossem a Rádio Cultura FM 103.3 de São Paulo e a TV Senado, com os programas Artur da Távola, Conversa de Músico e outros poucos. Na mídia impressa, só existem duas publicações de porte que tratam do tema: as revistas Concerto, de São Paulo, e Brasiliana, da Academia Brasileira de Música. Os jornais diários, especialmente em Brasília, dedicam espaço reduzido, quando dedicam!

Pergunta que não quer calar: por que tanto descaso? É um boicote nacional?? A quem se deve essa postura? À política cultural dos governos federal, estadual e municipal? Aos programadores das rádios e TVs? Aos redatores dos jornais e revistas? Aos responsáveis pela liberação das verbas e sua deficiente formação cultural? Ou a todos eles ao mesmo tempo? Alguém imagina uma solução? Por favor, apresente o mais rápido possível. A cultura brasileira agradece.



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